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Trabalho

Durante o Império Romano costumava-se usar um instrumento de tortura chamado tripalium. Constituía-se de um eixo formado por três (tri) vigas de madeira (palium – paus), onde se amarravam os escravos para lhes torturar.


Esse vocábulo foi passando de idioma para idioma sempre carregando sentido de “sofrimento, dor”. E talvez por, durante a Idade Média (período em que as línguas latinas mais se desenvolveram), a maioria dos trabalhadores serem camponeses (os quais, como se sabe, exercem atividades que exigem muito esforço físico), aquela palavra latina passou a designar justamente o serviço que eles faziam para sobreviver. Chegou ao francês como travailler, ao espanhol como trabajo e ao nosso português como “trabalho”.

Mas não só. Como disse, a palavra passou a se aplicar a atividades que, em geral, causassem dor e sofrimento. Por isso, no inglês ela chegou como travail, que significa “dores do parto”. Também nesse idioma ela originou a palavra travel, que significa “viagem” – realmente, em vista das feras selvagens, inúmeros ladrões e tortuosos caminhos repletos de perigos, viajar naquela época não deveria ser muito fácil.

Bem, o que importa é que, na sua raiz etimológica, o trabalho está associado ao amargor e à dolência. Às vezes, para se dizer “trabalhar”, falamos “labutar”. Ora, esta palavra vem justamente do substantivo latino para “fatiga, cansaço”, labor (verbete que também existe em nosso idioma), que por sua vez derivou do verbo labere cujo significado é “cambalear, vacilar”. Várias palavras de nosso idioma que estão associadas ao exercício de alguma atividade física ou mental têm origem nesse vocábulo, como por exemplo, laboratório, lavoura, colaborar, elaborar e laborioso.

Você pode estar se questionando onde eu quero chegar com isso tudo. Talvez Gêneses 3:17-19 lhe responda:

E para Adão Deus disse:
- Você fez o que a sua mulher disse e comeu a fruta da árvore que eu o proibi de comer. Por causa do que você fez, a terra será maldita. Você terá de trabalhar duramente a vida inteira a fim de que a terra produza alimento suficiente para você. Ela lhe dará mato e espinhos, e você terá de comer ervas do campo. Terá de trabalhar no pesado e suar para fazer com que a terra produza algum alimento; isso até que você volte para a terra, pois dela você foi formado. Você foi feito de terra e vai virar terra outra vez”.

Acho que agora o meu ponto ficou bem claro. O que eu quero dizer é que o desenvolvimento linguístico das palavras que designam o trabalho do homem nos faz convergir para Deus. Veja só: assim que o homem pecou, Deus o condenou à exaustão do trabalho (observe bem que Adão já trabalhava, mas sem a fatiga), e à mulher impôs as dores do parto.

O interessante é que em quase todas as culturas ocidentais as palavras usadas para expressar a atividade exercida pelo homem para obter o seu sustento estão associadas a dor e sofrimento. Uma das raízes, tripalium, retrata um método de tortura. A outra, labor, significa exatamente o cansaço que resulta do trabalho.

Talvez este artigo tenha menos abordagem devocional do que deveria ter. Mas que fique claro que meu objetivo com este texto não é falar de teologia, mas de metateologia; é mostrar, de outro ponto de vista, mais um argumento a favor da criação divina e seus desígnios. Não quero fazer nenhuma apologia à desnecessidade do trabalho ou qualquer coisa do tipo, mas apenas mostrar que, mais uma vez, a Palavra de Deus se mostra verdadeira e a obra do Senhor se expressa através da natureza, neste caso, mais precisamente, no desenvolvimento linguístico do homem. É como diria Paulo, ao criticar as pessoas perversas:

Porquanto o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou. Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que foram criadas” (Rm 1:19-20).